Já são muitos os animais de estimação por cá!
Não param de aumentar... agora espalham-se por frascos e frasquinhos.
Gosto de todos eles, são os meus pequeninos!
A fermentação natural era a que
os nossos avós usavam. Na época não existiam fermentos de compra, deixava-se um
pouco da massa da cozedura anterior guardada para a vez seguinte que, em geral
era dali a uma semana. O fermento industrializado veio acabar com esta forma
natural, muito mais saudável de fazer pão e que lhe conferia um sabor único,
verdadeiramente delicioso. Então porque se abandonou esta prática mais
primitiva de fermentação? Porque o processo é muito mais lento, pode demorar 24
horas ou mais! O progresso trouxe a rapidez, em menos de 3 horas temos pão
pronto a entrar no forno, mas retirou qualidade, o mesmo sucedeu com as
farinhas que passaram a ser branqueadas e receberam tratamentos químicos para
matar bichinhos e conservantes para poderem ter longos prazos de validade. Que
qualidade tem o pão que andamos a comer? O que se compra nos supermercados tem
um longa lista de ingredientes, é assustador porque alguns nem se percebe o que
são!
O topo de gama dos pães e fazem-se com massa mãe, farinhas fortes e uma longa levedação, são conhecidos
por Sourdough Bread. O "sourdough" (que se traduz à letra por massa azeda) felizmente está a regressar, são inúmeras as pessoas espalhadas pelo mundo que o confecionam em casa e os adeptos desta forma mais natural de fazer pão não param de crescer. Também já existem padarias a produzi-lo, embora em Portugal, ainda sejam poucas.
Fazer pão com fermento natural há muito que era um
desejo, porém este tipo de fermento não existe à venda, é preciso cria-lo e nem
sempre se revela fácil. São muitos os factores envolvidos e pode correr mal. Já
tinha feito algumas tentativas que terminaram de forma frustrante e abandonei a
ideia por algum tempo.
Recentemente recebi uma doação de fermento natural
da Raquel Bacelos, autora do blogue Aamigos da Cozinha, o que me deixou
radiante. Tenho alimentado esse fermento, alimentado com diferentes farinhas e
observado como reage em diversas receitas de pão. Pesquisei e li vários artigos
sobre o assunto e já com mais conhecimento, decidi voltar a tentar fazer o
processo de raiz.
Existem inúmeras formas de criar um fermento
natural, parte delas implicam um grande desperdício de farinha, pois a cada dia
uma parte do fermento é rejeitada, o que sempre me incomodou. Alguns métodos
recorrem a mel, uvas, maça, etc., para juntar mais agentes com bactérias e
leveduras ao fermento. Já tinha tentado com essas metodologias e desta vez
escolhi uma diferente e mais apelativa. O que se segue são todas as etapas da
criação do fermento natural que eu fiz, usando um processo bastante simples e
sem desperdício que me foi aconselhado e se encontra no blogue Testado e Aprovado.
Ao cultivar este fermento natural usei
apenas 2 ingredientes e uns "pozinhos mágicos"*:
1.º - Farinha de boa qualidade. Escolham com cuidado, parte
dos meus desaires anteriores começaram com a farinha, deve ser integral e
biológica, pode ser trigo ou centeio (ou outras). Convem usar sempre a mesma. Nesta experiência optei
por uma farinha de centeio integral e orgânica (já se encontra nos
supermercados comuns).
2.º - Água, muito importante tem que ser água sem cloro ou seja
água mineral;
* Os pozinhos mágicos, andam por ai, estão acessíveis a
todos, os fermentos selvagens que se encontram no ambiente, isso mesmo, no ar
que nos rodeia.
Mesmo que recebam um donativo de fermento
natural, ao fim de algum tempo ele adapta-se ao ambiente em que está
inserido e torna-se diferente do original, fruto dos fermentos selvagens
que existem no ar. è curioso que são diferentes de região ara região o que
torna cada fermento único.
Demora cerca de uma semana a criar um
fermento, por vezes precisa de mais alguns dias, foi o caso do meu.
A temperatura ambiente é um factor
importante, temperaturas amenas aceleram o processo, ao passo que o frio o
retarda. O ideal será entre 20º C a 26º C, mas mesmo com temperaturas
inferiores é possível obter bons resultados.
O mais fantástico é que depois de termos o
nosso fermento criado nunca mais necessitaremos de repetir este processo, basta
alimentar uma vez por semana e guardar no frigorífico.
Fermento Natural - Starter
Num frasco de vidro (com capacidade para 250 ml ou
mais) juntar:
30 g de
água mineral;
15 g de
farinha de centeio integral (biológica);
Misturar bem e reservar tapado, mas de forma que
permita a circulação do ar (lembram-se dos fermentos naturais do
ambiente?...precisamos deles). Deixar à temperatura ambiente, de preferência
num local quentinho.
Anote no frasco a data em que o iniciou o fermento,
esta será a data de nascimento do seu novo "animal de estimação" (na
verdade uma colónia deles).
Começamos com uma hidratação de 200% (o dobro da
água que da farinha), ao logo do processo iremos reduzir até obter 100% (a
mesma quantidade de água e de farinha).
2.º Dia
Não se passou nada de especial ainda, tudo parece
na mesma!
Hoje apenas mexemos o fermento algumas vezes ao
dia, pelo menos 2, uma pela manhã e outra à noite. Ao mexer estamos a facilitar
a circulação de ar entre a massa, o que vai ajudar as bactérias e as leveduras
a se desenvolverem.
Recomendo que cheirem a vossa mistura, vai ajudar
a perceber a sua evolução.
3.º Dia
Alimentar o fermento adicionando ao frasco:
30 g de farinha de centeio integral (bio);
30 g de água mineral;
Mexer muito bem. Obtem-se uma mistira mais espessa, já reduzimos a hidratação para 133%.
Ao longo do dia pode-se mexer algumas vezes.
É só isto por agora!
Á noite 0 cheiro já será um pouco diferente, ligeiramente avinagrado, o meio está a acidificar.
4.º Dia
Vamos equilibrar a quantidade de água e de farinha, de forma
a obter uma mistura com 100%. de hidratação.
Juntamos ao frasco:
15 g de água mineral;
30 g de farinha de centeio integral (biológica).
Mexer bem e deixar a natureza fazer a sua magia...
Estão agora no frasco 75g de água e 75g de farinha, o que
resulta em 150g de cultura a 100% de hidratação.
Têm cheirado o fermento?
Já notam diferença?
Poderá começar a evidenciar-se um cheiro mais frutado, as bactérias
que se desenvolveram no início estão a dar lugar aos fermentos.
5.º Dia
Hoje já se devem
notar algumas diferenças, o cheiro lembra vinho azedo, e começam a ver-se
algumas bolhinhas...podem não ser muitas, mas são motivo de alegria... Algo de
muito bom está a acontecer, o fermento está a desenvolver-se!
Acrescentar ao frasco;
30 g de água mineral;
30 g de farinha de centeio integral (biológica).
Mexer bem até obter uma mistura homogénea, ttapar permitindo a circulação do ar e deixar que os fermentos continuem a crescer.
Pode-ae ajudar
mexendo uma vez por outra ao longo do dia.
6.º Dia
Hoje a magia já se
revelou, pode verificar-se um ligeiro aumento de volume, são visíveis muitas
bolhinhas. O cheiro já é idêntico ao de um fermento natural, mais intenso
agora.
Vamos alimentar novamente o
fermento:
30 g de água;
30 g de farinha.
Mexemos como de costume
incorporando tudo muito bem.
Mais uma vez pode-se mexer
algumas vezes durante o dia.
7.º Dia
Hoje seria o dia de usar o fermento para fazer pão. já deveria estar pronto... o meu não estava, não cresceu o suficiente!
Voltei a alimentar seguindo o processo anterior:
Marquei o frasco com o nível da mistura para observar se havia crescimento na manhã seguinte. Fiz isto antes de ir dormir, cerca da meia noite.
8.º Dia
Voltei a alimentar, havia crescimento, mas mais uma vez não era suficiente.
9.º Dia
Que alegria senti pela manhã! O meu fermento duplicou de volume, demorou mais 2 dias , mas chegou lá! Havia muita vida dentro do frasco, as bolhinhas eram bem visíveis!
Estava no momento de lhe dar uma nova morada, um frasco limpinho e de o alimentar para usar na elaboração de um pão.
Preparação da Massa Mãe
Numa tigela colocar:
50g de fermento;
Juntar 50g de água e diluir o fermento na água mineral.
Adicionar 50g de farinha de centeio integral e misturar tudo muito bem.
Transferir para o novo frasco. Resulta desta mistura 150g de fermento natural também designado por massa mãe.
Agora é só aguardar pelo resultado... Idealmente deverá
crescer bastante, duplicando ou triplicando o volume inicial. Irá apresentar
bolhinhas e um cheiro a fermento algo frutado.
Vai levar várias horas para isso acontecer, entre 6 a 8 ou
até mesmo 12 horas, dependendo da temperatura ambiente. Quando isto acontecer
temos um fermento apto a usar para fazer pão. Usa-se o fermento quando está no
seu expoente máximo de crescimento, o que quer dizer que temos que programar
com antecedência quando queremos fazer pão.
Muitas receitas requerem apenas 100g de
massa mãe (ou seja o fermento alimentado), para um pão de cerca de 500g.
Há diversas formas de fazer a
alimentação do fermento, a mais comum é a 100% de hidratação, que
corresponde à mesma quantidade de água e farinha.
No frasco há agora 150g de
fermento, se retirarmos 100g para a elaboração de um pão, restam 50g. Voltam-se
a alimentar (50g de farinha + 50g de água) e pode-se recomeçar o
processo.
Caso não se queira voltar a usar guardam-se pelo menos 50g num
frasco hermético no frigorífico durante alguns dias, convém guardar após o
crescimento. Sendo um fermento jovem quanto mais vezes for alimentado, mais
força e vigor este vai ganhar. Terá que ser alimentado, no mínimo, uma
vez por semana, Se houver sobras de o alimentar vão-se guardando num
frasco para outras utilizações, nada se perde.
Caso a receita requeira uma quantidade de
massa mãe maior, ou se queira fazer mais do que um pão, pode-se alimentar
o fermento da seguinte forma:
100g de fermento + 150g
de água + 150g de farinha ;
ou
100g de fermento + 200 g de
água + 200 g de farinha.
Reservam-se sempre 50g para o
futuras utilizações.
Caso prevejam que não vão fazer
pão durantes algumas semanas, podem manter uma quantidade inferior de
fermento no frigorífico, apenas 20g ou 30g, mas nunca se esqueçam que deve ser
alimentado uma vez por semana. Se acontecer ficar 2 semanas
"esquecido", ou até mais, desde que não apresente bolores, pode
ser recuperado repetindo o processo inicial durante alguns dias.
Agora perguntam vocês...
Então o que fazemos ao fermento
que ficou no frasco original (o que sobrou)? No início dizia que não havia desperdico!
Podem ser generosos e oferecer
um bocadinho aos amigos que queiram experimentar fazer pão de longa levedação.
Podem congelar 50g ou 100g para
o caso de algo menos bom acontecer ao vosso fermento.
Podem ainda usar em variadíssimas
receitas que tenham nos ingredientes farinha e água, como por exemplo: nas vossas panquecas
favoritas, não esquecendo que a mistura contem água e farinha em partes iguais,
que devem ser subtraídas à receita original; usem na confecão de bolachas
de água e sal, ficam deliciosas; misturem uma parte na massa de pizza, fica
excelente! São inúmeras as possibilidades e algumas irão fazer parte de futuros
posts aqui no blogue.
Antes de me despedir, por hoje, falta algo muito importante, agradecer a um amigo virtual que conheci num grupo do facebook intitulado "Padeiras Amadoras do facebook" , chama-se Carlos Espiguinha e é um padeiro amador e autodidata, com um talento incrível e de uma amabilidade sem tamanho. Ele é responsavel por muito do que aqui hoje vos deixo bem como por muito do que tenho aprendido relacionado com o sourdough. Agradecer nunca é demais e por isso OBRIGADA CARLOS.